sexta-feira, 22 de abril de 2022

A HETERODOXIA NA LINGUAGEM DA PREGAÇÃO ATUAL

 A VERDADE:

"Uma das recomendações que ouvi na minha juventude, vinda de um homem sério, foi que o pregador não deve fazer rir aqueles que o ouvem. Sua pregação deve ser conclusiva, peremptória, criteriosa, decisiva, conscientizadora". 


A VERDADE EXPLICADA:

Uma pesquisa realmente interessada em constatar o caráter da linguagem bíblica, mostrará a pureza, a limpeza e o sentido religioso que acompanham toda a Escritura, de Gênesis a Apocalipse. Não há, em qualquer livro, em qualquer capítulo, o descaminho para o humor e o gracejo. Até mesmo nos Cantares de Salomão, onde a narrativa parece entremear a poesia com a realidade, as analogias são colocadas em termos respeitosos e no perímetro da seriedade. Em alguns capítulos dos Salmos poderemos encontrar hipérboles(1), mas a linguagem não se desencontra e não se torna jocosa. Nenhum dos escritores se vale dos recursos coloquiais para se afirmar perante os leitores. Aliás, nenhuma escritura mostra interesse de prender o leitor pelo seu discurso. Ela se afirma como verdade e se estabelece como aviso. Nenhum livro, nenhuma epístola se posiciona como entretenimento, como diversão. Não há duplo sentido nem entrelinhas. Nenhuma frase tem a intenção de fazer rir.

Emparelhadas com esta seriedade, com esta pureza, algumas pregações hodiernas(2) tornam-se peças destinadas a prender o auditório pelo lazer e pela curiosidade, quando não pelos “movimentos” do pregador, cujos reflexos nem sempre conduzirão o pecador à conversão.

A pregação não se destina a divertir. A pregação é um aviso e, muitas vezes, senão todas, um aviso urgente (I Co 10.11; Ez 33.8). Um aviso que pode redundar em sérios prejuízos para aquele que desprezar a sua urgência e a sua validade (Jn 1.1; 3.1). Muito mais para aquele que desprezar a sua seriedade, a sua ortodoxia(3). Ela é afeita muito mais a comover e causar lágrimas do que risos. Os ais que JESUS lançou sobre as cidades impenitentes (Mt 11.20-24), não eram tiros de festim, mas verdades destinadas a trazer o povo à realidade da sua situação pecaminosa e isso com a comparação entre suas atitudes e as de cidades grandemente pecadoras da antiguidade. O que JESUS disse a Nicodemos sobre o novo nascimento (Jo 3.3,19,39), produziu a sua real conversão. O encontro de Saulo com JESUS na estrada de Damasco foi uma chamada decisiva que lhe produziu muitas vitórias, mas através de muitos sofrimentos e não de aplausos. A ordem de JESUS (Mc 16.15-17), contém um forte aviso aos descrentes: “...quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado ...” Não há meio-termo, não há subterfúgio(4). Não há frases feitas, não há anáforas(5), repetições tendenciosas (Mt 6.7). E, sobretudo, não há “brincadeiras” que distraiam o pecador do seu verdadeiro estado.

Em contrário, alguns pregadores atuais parecem querer divertir seus ouvintes. Uma das recomendações que ouvi na minha juventude, vinda de um homem sério, o missionário Frantz Manjernes foi que o pregador não deve fazer rir aqueles que o ouvem. Sua pregação deve ser conclusiva, peremptória, criteriosa, decisiva, conscientizadora. O pregador do Evangelho não pode ser divertido, dado a mímicas, a trejeitos e gestos rebuscados. A sua retórica não deve ser vazada em linguagem que desmereçam a reverência da pregação. Ouvi um pregador fazer comparações que levaram seus ouvintes ao riso e ao fim da reunião evidentemente não houve conversões. Há pregadores radiofônicos que usam o tempo que tem para evangelizar divertindo os ouvintes. Seus cânticos não demonstram louvor, mas divertimento. Suas frases de efeito são nítidos passatempos “enquanto os irmãos vão chegando”. E o clima do culto vai nesse tom, sem qualquer forma de convencimento.

Há um costume quase geral atualmente em alguns pregadores, de tratar o plenário da igreja por 'você'. Esse tipo de intimidade também desautoriza o pregador, além de caracterizar um desrespeito a personalidades que estejam visitando o culto. Não estamos exigindo “sublimidade de palavras”, termos eruditos(6), cujo alcance seja difícil a muitos ouvintes, mas reivindicamos uma linguagem respeitosa e sobretudo reverente. As verdades bíblicas não se distanciam do respeito e da reverência.

A defesa da atualidade, da época e da modernidade não nos facilita entrarmos pelo caminho da distração, em detrimento do nosso dever de trazermos as almas a Cristo. Argumentar que pregadores efusivos, divertidos são do agrado dos jovens pode não ser inteiramente verdade. O que temos reparado é que pregadores ortodoxos, respeitosos e comedidos encontram maior aceitação entre os ouvintes e maior alicerce na Palavra de Deus.


(Por: Miguel Vaz)

(Fonte: MP 1247/Janeiro de 1991)


(1) ênfase expressiva resultante do exagero da significação linguística; auxese, exageração (p.ex.: morrer de medoestourar de rir ).

(2) que existe ou ocorre atualmente; atual, moderno, dos dias de hoje.

(3) interpretação, doutrina ou sistema teológico implantado como único e verdadeiro pela Igreja; dogmatismo religioso.

(4) manobra ou pretexto para evitar dificuldades; pretexto, evasiva.

(5) repetição de uma palavra ou grupo de palavras no início de duas ou mais frases sucessivas, para enfatizar o termo repetido (p.ex.: este amor que tudo nos toma, este amor que tudo nos dá, este amor que Deus nos inspira, e que um dia nos há de salvar).

(6) instrução, conhecimento ou cultura variada, adquiridos esp. por meio da leitura.


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